sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Pensar a cidade


Por Rafael Rodrigues

As cidades adquirem na modernidade um estatuto novo na história, não somente quantitativo, mas, sobretudo, qualitativo. Pois, se afirmar que cidades existem desde a mais remota antiguidade, não é senão no século XIX que vemos emergir uma ciência da cidade: o urbanismo, quando pela primeira vez a cidade se torna foco de observação, analise e discurso” (PECHMAN, 1997).
  Esse urbanismo se alinha com uma proposta de  reforma social que tem base na medicina higienista, na estatística sanitária ,e na criminologia ambientalista, e assim estabelece um novo modo de olhar a cidade.                                    E sobretudo os novos traçados da cidade moderna, importados principalmente da Paris do Barão de Haussmann, com suas ruas largas avenidas iluminadas que incitavam o movimento incessante das multidões, foram aclamados exemplos a serem seguidos em todas as cidades, de forma a garantir o funcionamento do “organismo” termo empregado na concepção iluminista da cidade comparada ao corpo que deveria funcionar bem em cada uma de suas unidade e em sua totalidade.
Mediante a instauração de uma cidade modelo, ou ideal, elegi-se o que faz de uma cidade bela e funcional, estabelecendo sonhos “ promessas de completude”.  O mesmo ideal que instaura o belo, instaura também o que é desviado, o crime , desordem como mal em si, então se imperam padrões de estética de harmonia, limpeza e organização e por conseqüência torna-se necessário praticas de exclusão.  

O poema de Baudelaire, intitulado “ O olhos dos Pobres”, que situado na época da reconstrução de Paris por Haussmann, coloca essas questões de maneira muito clara, e em seu cerne, em nada distante dos dias atuais:
De noite, um pouco cansada, você quis se sentar num café novo na esquina de um bulevar novo, todo sujo ainda de entulho já mostrando gloriosamente seus esplendores inacabados. O café resplandecia. O próprio gás disseminava ali toda suas forças as paredes ofuscantes de brancura, as superfícies faiscantes dos espelhos, os ouros das madeiras e cornijas, os pajés de rechonchudas puxados por coleiras de cães, as damas rindo o falcão em suas mãos, ninfas e deuses portanto frutos na cabeça, os patês e a caça, as Hebes e os Ganimedes estendendo a pequena ânfora de bavarezas, o obelisco bicolor  dos sorvetes matizados; toda a historia e toda a mitologia a serviço da  comilança. (BAUDELAIRE, 1995)
Olhos nos olhos, os dois amantes deste conto trocam juras de amor, confidencias e prometem-se a união de suas almas e pensamentos para que possam estar eternamente juntos e em paz. No entanto, este plácido “olhos nos olhos” estes arregalados de fascínio. A estranha família de olhos arregalados se aproxima de cena dos apaixonados que  tinham a oportunidade de viver seu amor tão privado sob as luzes de Paris.
Os olhos do pai diziam: “como é bonito! Como é bonito! Parece que todo o ouro do pobre mundo veio para nessas paredes .” Os olhos do menino: “ Como é bonito, como é bonito, mas é uma casa onde só entra gente que não é como nós’’. Quando aos olhos do menor, estava fascinado demais para exprimir outra coisa que não uma alegria estúpida e profunda (BAUDELAIRE, 1995)
A distancia que separava os habitantes nobres de Paris dos seus “ex-habitantes’’ indesejados era tão falaciosa quanto a proximidade que uniam os dois amantes. Pois o narrador-personagem do poema, ao sentir-se incomodado, e mesmo com alguma afinidade pela estranha família, olha para a amante a fim de encontrar o mesmo sentimento em seus olhos, o que se mostrou uma busca vã. Extremamente indisposta, a mulher manifesta seu desejo de que o responsável por agendar os clientes venha intervir e tirar da vista, de uma vez por todas, a indesejada família.

Importante ressaltar, que partimos da idéia de que o individuo, suas ações e modos de pensar, o que nos remete ao “modo de olhar a cidade” não se desassociam das subjetividades que o rodeia ou seja: é completamente influenciado pelo espaço que o cerca,  então, como arquitetos urbanistas devemos nos atentar para quais influencias estão presentes nas nossas propostas, o termo influencia poderia ser substituído por “força” trabalhado segundo foucault .

RODRIGUES, Ana Cabral -  A Politização de Vazios  





Um comentário:

  1. O Barão Eugene Haussmann fez uma reforma urbana não uma reconstrução Em todo caso, a abordagem dos pobres, dos excluídos da cidade, tornando-se sub-urbanos, abaixo dos urbanos...

    ResponderExcluir