A pedido do rei
Minos, Dédalo construiu um Labirinto no qual o rei aprisionou o Minotauro,
fruto do adultério de sua mulher. Tendo sido cúmplice da traição contra o rei,
Dédalo caiu em seu desagrado e foi, junto com seu filho Ícaro, aprisionado em uma
torre no labirinto.
Sabendo que a prisão
era intransponível e que o rei controlava mar e terra, Dédalo decidiu fugir
pelo ar e para tanto põs-se a projetar asas, juntando penas de aves de vários
tamanhos, amarrando-as com fios e fixando-as com cera, para que não se descolassem.
Foi moldando com as mãos, de forma que estas asas se tornassem perfeitas como
as das aves. Estando pronto o trabalho, o artífice, agitando suas asas, se viu
suspenso no ar. Equipou Ícaro e o ensinou a voar lhe advertindo antes do vôo
final:
- Ícaro, meu filho!
Recomendo-te que voes a uma altura moderada, pois se voares muito baixo, a
umidade tornará suas penas muito pesadas e, se voares muito alto, o sol
derreterá a cera que as cola. Conserva-te perto de mim e estarás em segurança.
Todos que abaixo
estavam contemplavam atônitos o que viam, julgando serem deuses aqueles que
conseguiam cortar o ar de tal modo.
Mas Ícaro, não
resistindo ao audacioso impulso de se aproximar do céu, subiu demasiadamente e,
ao chegar perto do sol, a cera fundiu-se, soltaram-se as penas, e ele caiu no
abismo do mar Egeu. O pai, vendo as penas flutuando na água e lamentando a
própria arte enterrou o corpo e denominou a região de Icária, em memória do
filho.
Embora engenhoso
representante do intelecto e da racionalidade técnica, Dédalo tinha tanta
vaidade com suas realizações, que não tolerava a idéia de um rival. Sua irmã
entregou aos seus cuidados um filho, Pérdix, a fim de aprender as artes
mecânicas. O jovem era um bom aluno e deu provas de notável habilidade. Dédalo
teve tanta inveja das invenções do sobrinho, que certo dia, quando se
encontravam juntos, no alto de uma torre muito elevada, atirou-o para fora.
Minerva, protetora da habilidade, vendo-o cair evitou a sua morte, transformando-o
numa ave, que recebeu seu nome, a perdiz.
Essa ave não
constrói seu ninho nas árvores nem voa alto, acomodando-se nos arbustos e,
lembrando-se da queda, evita os lugares elevados.
Esse mito nos parece
apontar para uma mediação por onde a arquitetura contemporânea ainda não se
encontra capaz de transitar.
Na construção arquitetônica é preciso empreender uma passagem do discurso para a edificação do objeto próprio da Arquitetura. Muitos arquitetos contemporâneos têm edificado literalmente seus discursos. Há uma diferença fundamental entre o discurso sobre a arquitetura e o edifício arquitetônico construído.
Precisamos inaugurar
com a arquitetura a recomendação de Dédalo que, antes do vôo escapatório do
labirinto ao qual pai e filho se encontravam condenados, ensina:
“Ícaro, voemos pelo meio, voemos por onde é
possível voar, por entre o sol e o chão, por entre o céu e a terra, voemos por
onde se pode construir a sombra, pois o esclarecimento da luz inteira não é coisa
para os homens.”
“Enquanto isso nós,
arquitetos contemporâneos seduzidos e imobilizados pelo encanto do brilho glamoroso
do sol, arquitetos-ícaro continuamos a despencar nos abismos impalpáveis de
nossos próprios feitos, ditos arquitetônicos (...) A construção de uma atitude
por uma ‘arquitetura menos’ depende de um trabalho cotidiano e próximo do
particular de cada homem que carece e deseja nomear um território. Pouco se
encontra encaminhado para tanto que ainda está por fazer. Cabe aos arquitetos
dos próximos dias projetar as construções que serão intermediárias à nossa
necessidade atual de habitar nosso mundo”. (Mattos Corrêa , Adriano)
Referências:
_Bulfinch Thomas, “O
livro de ouro da mitologia – Histórias de deuses e heróis”
_Mattos Corrêa , Adriano,
“A dádiva de Dédalo: um diálogo entre literatura e arquitetura” – Belo Horizonte,
v.5,p. 113-120, dez. 2002
Postado por Bárbara Veronez
Nenhum comentário:
Postar um comentário