segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Deserto de Detroit


Postado por Larissa Cosmi

O estranho desafio dos urbanistas de Detroit (USA): como encolher a cidade

14 abril , 2011
Monica Davey

Quando Marja M. Winters estava estudando planejamento urbano na faculdade, ela aprendeu a arte e a ciência de ajudar as cidades a crescer.

Agora Winters, nativa de Detroit e vice-diretora do departamento de planejamento e desenvolvimento da cidade, encontra-se num papel inesperado, um papel para o qual nenhuma escola pensou em prepará-la: ela está tentando descobrir como ajudar sua cidade natal a encolher, tomando decisões difíceis que determinarão quais bairros podem ser salvos e quais não.

“Sempre houve essa noção de que a população do mundo continua a crescer, e mais e mais pessoas querem viver nas cidades”, disse Winters, 33, sobre seus cursos na Universidade de Michigan. “A realidade é bem diferente. Quem saberia dizer?”

Avaliar a melhor forma de reduzir uma cidade não é algo totalmente desconhecido (já foi considerado em Youngstown, Ohio; e Flint, Michigan). E o prefeito Dave Bing estabeleceu como sua maior prioridade lidar com a população em rápida queda de Detroit e com o colapso de sua infraestrutura, transferindo aqueles que sobraram para poucos bairros, em vez de deixá-los espalhados por uma cidade de 360 quilômetros quadrados, cujos limites faziam mais sentido quando o dobro de pessoas moravam aqui há 40 anos.

Na verdade, realizar um esforço como este, em particular numa cidade tão vasta quanto Detroit, é como resolver um conjunto complicado de quebra-cabeças entrelaçados, como Winters descobriu durante dias longos e algumas noites debruçada sobre milhares de páginas de mapas e estatísticas em seu escritório no 23º andar do centro da cidade.

Como reconfigurar as estradas, linhas de ônibus, distritos policiais? Como encorajar as pessoas – não há um poder para obrigá-las – a sair dos piores bairros e ir para bairros melhores?

No final deste mês, uma equipe da qual Winters faz parte deve apresentar uma proposta – certamente muito controversa – de mapa para servir de guia para os investimentos em cada um dos bairros da cidade. Um plano final para uma cidade refeita deve ficar pronto até o final do ano.

“O maior equívoco é achar que não precisamos mudar”, disse Bing, que foi eleito em 2009 e descreve sua cidade como um lugar que está “machucado” e “doente”.

“Os maiores problemas são as pessoas que moram na periferia, mais do que qualquer outra coisa, onde os bairros decaíram a um ponto em que não faz mais sentido reinvestir”, disse ele. “As pessoas dirão: ‘bem, por que não eu?’ E eu digo: não temos dinheiro para fazer isso.”

Detroit já está encolhendo por conta própria, é claro. Números recentes do censo mostram que a cidade, que já foi a quarta maior do país, perdeu um quarto de sua população só na última década, deixando-a com menos de 714 mil habitantes.

Mas a perda de população foi espalhada por toda a cidade, o que significa que as casas vagas e depredadas e os terrenos vagos pontuam os bairros de Detroit, em vez de surgir em pedaços consolidados e convenientes da periferia da cidade, deixando um centro mais vibrante. De fato, alguns dos bairros mais bem cuidados estão nas periferias, enquanto os locais problemáticos estão mais próximos do centro.
E assim, um contingente de consultores privados e funcionários municipais como Winters estão participando de uma das análises mais profundas da história de Detroit, avaliando a densidade populacional, casas hipotecadas, doenças, parques, ruas, encanamentos de água e esgoto, rotas de ônibus, terrenos públicos, e assim por diante.

Entre as descobertas mais tristes: mais de 100 mil terrenos, privados e públicos, estão vagos, e apenas 38% dos habitantes de Detroit trabalham na cidade.

O objetivo é identificar os bairros mais fortes e mais viáveis, que receberiam atenção e ajuda adicionais do município. Os moradores de alguns dos bairros mais fracos e vazios seriam incentivados a se mudar.

Será uma venda difícil para pessoas como Luther Gordon, cuja casa na zona leste da cidade fica na frente de uma casa vazia que pegou fogo algumas noites atrás e um lote vago num quarteirão cheio deles.


“Vou ficar exatamente aqui”, disse Gordon, 54, sobre a possibilidade de que seu bairro de mais de duas décadas possa ser considerado abandonado demais para ser salvo. “Eu não planejo ir para nenhum lugar a não ser para debaixo da terra.”

Os rumores estão circulando pelos bairros. O principal é o de que os piores bairros serão fechados, a energia será desligada e os prédios derrubados. A verdadeira intenção, disse Winters, é bem mais sutil, e lenta.

Embora a cidade ofereça algum tipo de incentivo para as pessoas de bairros miseráveis se mudarem, nenhum bairro será simplesmente fechado, diz Winters. Um lugar que não for considerado valioso para novos investimentos residenciais pode ver mudanças sutis: serviços como coleta de lixo podem ficar mais lentos, de uma vez por semana para até uma vez a cada 12 dias.

“Queremos reduzir o custo dos serviços para a cidade, mas também queremos manter uma qualidade de vida básica – a chave é como equilibrar isso?”, disse Winters.

O plano definitivo para esses bairros – o custo final para consolidá-lo – é incerto; alguns bairros poderão abrigar novas indústrias, e alguns poderão ser usados para preencher necessidades temporárias, ou para jardins urbanos e espaço verde.

Em bairros mais abastados, como o Indian Village, onde mansões preenchem os quarteirões e equipes de cortar grama estavam trabalhando na semana passada, a ideia de diminuir os bairros da cidade parece ter apelo para muitos moradores.

“Quando vou para alguns bairros hoje, fico com lágrimas nos olhos, simplesmente não consigo acreditar no que vejo”, disse Rukayya Ahsan-McTier, que andava rapidamente para se exercitar no Indian Village, enquanto carregava um taco de golfe em uma das mãos para se proteger dos cachorros de rua ou, como ela disse, de qualquer problema que possa aparecer.

Ainda assim, até Ahsan-McTier tem dúvidas sobre como o plano da cidade funcionará. Como o município convencerá as pessoas a sair de bairros mais baratos para ir para bairros mais caros? E será que os novos vizinhos se integrarão?

Em outros lugares, as pessoas tinham suas próprias preocupações: será que isso será apenas mais um capítulo da “renovação urbana” na qual os mais pobres, menos escolarizados e menos sortudos serão obrigados a mudar? E o que exatamente acontecerá com os bairros com menos serviços, que já são infestados por novos tipos de crimes que os moradores descrevem como audaciosos? (Lojas de alguns bairros começaram a colocar blocos de cimento do lado de fora de suas entradas de vidro, dizem os moradores, para evitar que os ladrões entrem com seus carros pela porta para assaltar.)

“Tenho esperança, mas não sei o que tudo isso significará”, disse Bayard Kurth, que trabalha com impressão no West Village, outro bairro bem estabelecido. “Grandes cinturões verdes na cidade? Lugares sem monitoramento onde as pessoas fazem o que querem? Festas de dia inteiro?”

Por sua vez, as autoridades dizem que a polícia e os bombeiros sempre servirão a todos os bairros de Detroit – até aqueles em que restaram apenas poucas pessoas.

A esperança de Bing é que um “grupo central” de bairros conectados ao centro, e à espinha dorsal da cidade, a Avenida Woodward, continuem existindo, e que o plano por fim ajude a acabar com o êxodo de habitantes de Detroit.

Mais tarde, Winters passou horas numa reunião com grandes grupos para conversar sobre suas preocupações. Na semana passada, clérigos fizeram perguntas a ela; antes disso, foram os moradores mais antigos. No final deste mês, ela também deve se encontrar com os jovens, artistas, ambientalistas e empreendedores.

“É tudo muito difícil”, disse Winters outro dia. “Há muita coisa envolvida, não podemos simplesmente nos dar ao luxo de errar. Temos que acertar isso, agora mesmo.”

Tradução: Eloise De Vylder

Fonte: The New York Times

Um comentário:

  1. Veja o trabalho do Escritório Interboro IMPROVE YOUR LOT! Tobias Armborst, Daniel D’Oca, and Georgeen Theodore (INTERBORO)

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